O ano de 2020 continuou a ser um tempo de salalé para o imobiliário angolano. Ninguém vê soluções para o ciclo de destruição que o sector vive, acompanhando a tendência de toda a economia.
Se não for travado, o ciclo de destruição porá em ruínas o potencial que o imobiliário conseguiu. Os empresários do ramo não sabem o que fazer, muitos proprietários vendem a qualquer preço e transferem-se para outras áreas.
A lufada de ar fresco que veio da mudança no poder político parece ter-se esfumado, face à ausência de medidas para recuperar o sector, contrastando com a forte presença pública sentida no passado, quando o sector renasceu de décadas de paralisia.
O sector está abandonado a si próprio, já o estava antes da pandemia. O Estado preocupa-se com a sua imagem, procura prestigiar-se para se preservar e ganhar compromissos eleitorais. Para o Estado, envolver-se de momento na trama do imobiliário, que cresceu na opacidade, é muito arriscado.
Apenas numa única coisa o Estado se mete, na recuperação dos grandes imóveis construídos à custa de dinheiros públicos, caso da CIF, das Torres do eixo viário, do edifício da Medical Center e outros nas mãos de altas figuras do país. Também se concentra nas centralidades, mas sempre na perspectiva de ir buscar bens que estavam entregues a particulares.
Tudo o resto terá de esperar por melhores dias, o que significa, em termos de construção, que muitos projectos imobiliários continuarão parados e entregues ao poder destruidor do salalé. É uma linha de economia estatizante aquela que se segue, diferente da promessa de transformar a actividade privada no motor da economia.
A imagem exacta do estado de degradação em que mergulhou o sector imobiliário é dada por dois exemplos. O primeiro é o projecto Vila Maquis, uma urbanização construída no Quilómetro 38 de Luanda, destinada a antigos combatentes. As vivendas da primeira fase do projecto, apesar de prontas, não foram entregues aos compradores e estão a ser comidas pelo salalé e o capim. Referir que o financiamento deste projecto estava a cargo do BPC, o maior banco público que entrou em falência, é dizer tudo.
O segundo exemplo é o da Cimenteira de Bom Jesus, um empreendimento gigantesco, essencial para a construção civil, afecto à China International Fund (CIF), que foi confiscado pelo Estado. Encontra-se em tal estado de abandono que dá pena. Se nada for feito para o reactivar, como parece ser o caso, já que o Estado já demonstrou que não sabe gerir empresas, a cimenteira acabará por ser engolida pelo salalé e desaparecerá.
Muitos outros projectos, lançados no período alto do imobiliário angolano, que durou quase uma década, estão espalhados pelo país e a perder-se irremediavelmente. Ninguém sabe em que situação estão as construções feitas no âmbito do Programa 200 casas em Cada Município, idealizado pela equipa económica numa perspectiva de despesismo absurdo de construção habitacional do Estado.
Subjacente a toda essa crise que atravessa o imobiliário angolano estão questões de diversa natureza. Uma das mais importante é a perda de recursos de financiamento, o crédito que antes corria a rodos, subitamente deixou de existir e agora falta em absoluto.
Mas agravar a crise está uma filosofia de trabalho que considera que privado é privado e Estado é Estado, não se misturam. Por causa dos interesses cruzados e da forma como as coisas evoluíram no passado, Estado e privados parecem não encontrar uma plataforma sobre a qual se entendam e encontrem soluções para a crise.
Com os PIIM, uma soberana oportunidade para resolver os graves problemas de saneamento básico nos municípios está a ser perdida. Continua-se a apostar no asfalto e na imagem. Com o caos urbanístico presente, a EGTI ainda vende terrenos infra-estruturados para os compradores construírem, um modelo que falhou no passado e nada garante que venha a funcionar desta vez. Como as obras do Metro, que aí vêm em breve, tudo parece caminhar para lançar o caos por cima do caos.
O potencial imobiliário angolano está a degradar-se. Se nada for feito, se Estado e privados continuarem de costas voltadas, a crise no sector acentuar-se-á e os problemas de um sector tão importante como este, que afecta a vida das famílias e das empresas e tem um peso importante no PIB, deixarão de ser apenas do salalé e acabarão por transformar-se num sério problema político.