Em 2019 o mercado imobiliário deverá reflectir uma série de condicionantes que emperram o sector. A solução desses factores será importante para aferir da evolução estável ou não do mercado imobiliário.
Em primeiro lugar, o mercado irá reflectir as medidas inscritas no segundo orçamento do Governo do Presidente João Lourenço, que assumiu as rédeas do poder em Angola em Setembro de 2017.
Só em construção de imóveis, o OGE de 2019 projecta um gasto de 397 milhões de dólares, superior em 23,6% ao de 2018.
O primeiro orçamento do novo Governo, o de 2018, começou trôpego. Foi antecedido de um plano intercalar, aplicado entre Outubro de 2017 e Março de 2018, porque após as eleições não havia orçamento aprovado pelo Parlamento.
O verdadeiro orçamento apenas começou a vigorar em Março, uma vez cumprido o ritual parlamentar.
Em segundo lugar, o mercado poderá ressentir-se da ruptura entre o Governo e a Imogestin, a imobiliária que geria, construía e comercializava as centralidades e urbanizações construídas pelo Estado e que vai ficar sem essa fatia.
A ruptura com a Imogestin, anunciada por fonte governamental ao semanário “Expansão”, é importante tanto pelo significado que encerra como pelo efeito que terá no mercado.
O impacto será maior se se confirmar que a gestão será entregue ao Fundo de Fomento Habitacional (FFH), uma estrutura sem condições para uma tarefa que já é de grande dimensão.
Milhares de imóveis a entrar no mercado
Por enquanto, o Governo nada diz oficialmente. Mas esta questão é crucial para o mercado, porque a Imogestin preparava-se para colocar no mercado em 2019 mais de 2.000 imóveis, que começaram a ser entregues em Outubro de 2018.
A entrada de tão grande oferta no mercado imobiliário iria ter forte influência na variação dos preços praticados fora do mercado estatal.
Face ao afastamento da grande imobiliária, não se sabe como irá reagir o mercado, talvez com desconfiança.
Uma outra promotora imobiliária, a Kora Angola, também gere centralidades, mas sobre esta empresa nada ainda foi dito. Mais incerteza para os investidores.
À medida que se adensa o ambiente, perde-se o efeito sobre uma continuada descida dos preços dos imóveis diante da entrada massiva de imóveis do Estado no mercado, de modo a estarem ao alcance da maioria dos angolanos, já que, por regra, muitos imóveis vendidos pelo Estado acabam na especulação.
Durante o Fórum Nacional Urbano, em finais de Outubro de 2018, o Director Nacional de Habitação anunciou que Estado vai construir mais sete novas centralidades.
Aproximação das eleições autárquicas
Em terceiro lugar, mas não por último, o mercado angolano irá reflectir a aproximação das primeiras eleições autárquicas em Angola, marcadas para 2020, já no próximo ano, momento propício à apresentação de obra feita, algo que mexerá com a construção civil, a habitação e, consequentemente, o imobiliário.
Qualquer um destes factores gera expectativas, que poderão ser boas ou más para os negócios, dependendo das medidas que forem tomadas, pelo Estado ou pelos investidores privados.
O sector imobiliário angolano atravessa uma fase que exige visão e decisões. Depois do crescimento vertiginoso que a construção imobiliária viveu com o advento da paz em 2002, aproveitando o preço alto do petróleo até 2009, o sector entrou em crise de financiamento, as “yields” caíram e muitos grandes projectos estão parados.
Mas da era do maná do petróleo ficou uma importante oferta de imóveis, apartamentos, vivendas, escritórios e espaços comerciais que as cerca de 20 grandes empresas imobiliárias mostram não ter pressa em vender, porque estão a valores que o crédito bancário não aceita cobrir, e que os pequenos “corretores” angolanos, sobretudo jovens, procuram disputar com uma oferta de imóveis mais baratos.
A oferta de qualidade concorre com outro pecado do imobiliário angolano, o caos e o desordenamento.
Apesar de ter desenvolvido vasta legislação, o mercado angolano foi colocado na faixa dos “opacos” no Índice de 2018 da Transparência Imobiliária na África Subsaariana pela consultora JLL, cotada no NYSE.
No índice Angola aparece em 10º lugar, abaixo da África do Sul, Botswana, Maurícias, Quénia, Zâmbia, Nigéria, Ghana, Ruanda, Uganda e acima da Tanzânia, Etiópia Costa do Marfim, Moçambique e Senegal.
Preocupada com o caos urbano, em Março de 2018 a Associação dos Profissionais Imobiliários de Angola (APIMA) apresentou ao Ministro da Justiça e dos Direitos Humanos uma carta contendo mais de 20 propostas para “aquecer” este mercado.
A associação destacou no documento que a venda ilegal de terrenos tornou-se “o grande negócio em Angola” e que essa prática é “facilitada em grande parte das vezes pelos funcionários das administrações comunais”.
Letargia e potencial
Por duas vezes em 2018, o Presidente angolano referiu-se a este sector importante da economia.
Durante a mensagem ao parlamento nacional sobre o estado da Nação, em meados de Outubro, João Lourenço destacou que a iniciativa privada é fundamental para retirar o sector da “letargia”.
Em Dezembro, na segunda conferência de imprensa concedida a jornalistas nacionais e estrangeiros, o Presidente deu a entender que o Governo terá de tomar no âmbito da Operação Resgate para obrigar os inquilinos a pagarem as rendas das habitações do Estado.
O mercado imobiliário angolano tem um potencial que pode ajudar a economia angolana a deixar de depender apenas no petróleo e diversificar-se.
Mas se quiser voltar ao caminho do crescimento e da prosperidade, o sector imobiliário angolano terá de ultrapassar algumas condicionantes: a falta de financiamento, a opacidade e a burocracia.
Apontamos aqui alguns dos entraves, não os únicos.